sábado, 23 de novembro de 2013

O poeta, a musa e o Portal de Delfos

Ele a amava profundamente. Seria capaz de dar sua vida por ela. No início ele a via no estacionamento e podemos até pensar que fosse uma atração sexual muito forte por ela. E daí? Que mal tem nisto? É preciso deixar de lado estes preconceitos de nossa civilização cristã ocidental para adentrarmos neste mundo maravilhoso que envolve duas pessoas. Ele se encantava com seu corpo andando compassado como se estivesse brincando em uma cama elástica. Quando o vento tocava seus cabelos ele se recordava da época em que corria em sua criancice pelos canaviais. Lembrava-se dos assovios do vento suspendendo as ramagens das canas. Seus óculos escuros colocados sobre a cabeça colocavam-na acima de qualquer artista de cinema. Era ela linda? Seus suspiros que o digam enquanto ela passava. Aos poucos aproximou-se dela. Levou algum tempo e como costume de nossos dias ele pediu-lhe seu e-mail e deu-lhe o seu. Ela nunca respondeu nenhuma comunicação dele. Encontravam-se por acaso e conversavam sobre tudo. Quanto mais encontro, mais encanto. Se esta fase foi a do encantamento, podemos dizer que ela foi uníssona e eterna. Ele nunca se desencantou dela. Mesmo quando tomou aquela última decisão incompreensível para qualquer ser humano comum. O início não foi fácil. Eram conversas esporádicas sobre tudo. Como ele ficava totalmente perdido, com certeza falou muita coisa sem nexo, sem sentido, pois aproximar-se dela era estar diante de uma força sobrenatural. Mas ele teve um problema muito sério para resolver. Quando jovem fora jogador de futebol. Chegou a ser vice-campeão em seu estado no futebol de quadra. Porém, uma bolada em seu olho despedira-o definitivamente do mundo dos esportes. Poderia ter sido um dos maiores goleiros do País, mas esta não foi a intenção do destino. Mesmo enxergando pouco ele via longe. Percebeu na juventude que a democracia era uma forma de governo superiora a um regime de terror. Por esta razão participou junto com as esquerdas, embora o apelido pejorativo não lhe caiba, da reação à supressão da liberdade. Custou-lhe muito caro as perseguições que sofrera e a perda de todos os seus amigos. Recebeu como prêmio a capa do gerdai. Com certeza em sua juventude não teve tempo para amar a ninguém. Sua amada era sua Pátria amada. Talvez isto justifique em idade adulta, como raiz intrapsíquica, este amor estupendo por esta maravilhosa ninfa. Pois bem, ao pular em um trampolim, caiu de mau jeito e quase morreu afogado, causando uma gravidade muito grande à sua saúde. Teve que passar dois anos em tratamento. Um guerreiro é sempre um asceta. A persistência, a organização , a determinação eram seus pontos mais fortes. Então, ele se dedicou dia a dia na sua recuperação. Com sequelas conseguiu recuperar-se o suficiente para enfrentar a realidade e driblar os olhares alheios. Durante estes dois anos ele não se esqueceu dela. Em uma viagem a um mosteiro, durante uma palestra ele se encontrou com ela por acaso. Por acaso é claro que não foi de forma alguma. Quem é jungueano sabe muito bem disto. Dali renasceu uma verdadeira amizade. Tudo coincidia entre eles. Gostavam das mesmas músicas. Adoravam meditar em silêncio. Riam das mesmas coisas. Um dia ele resolveu mostrar-lhe um texto indiano, mas ela estava com muita pressa e fez um beicinho de raivinha. Ele percebeu e foi para casa. Não parava de pensar no rostinho dela com carinha de nervosa. A partir daí percebeu que estava realmente apaixonado por ela. Ela ficava mais linda ainda quando estava bravinha. Começou a pensar. Se quando ela está no natural eu sou doido por ela e quando ela está nervosinha eu acho ela tão bonitinha, esta é a mulher com quem Deus me deu para casar-me. Com uma mulher assim eu posso viver feliz. Ele já estava desgastado de tantas relações infrutíferas. A diferença de idade entre eles marcava uma grande preocupação para ele. Ela podia ser sua filha. Mas ele como um bom guerreiro sempre praticou exercícios físicos e luta livre. Alimentava-se com cuidado. Não tinha vícios. Uma cervejinha lá uma vez ou outra não mata ninguém. Pela idade que tinha, poderia carregá-la no colo por longa distância se quisesse, embora ela também fosse alta. Como Pitágoras, ele apresentava-se muito forte após a meia idade. Pela primeira vez na vida ele soube o que era o amor. Não tinha amado alguém. Certamente, na idade em que estava diante desta descoberta ele se desequilibrou um pouco. Ao lado dela ele se perdeu, pois um menino do sertão quando chega pela primeira vez diante do oceano, ele não sabe o que vai fazer. Ele se preocupava com ela como se preocupava com ele. Mas ela não foi capaz de entender isto. Ele tentou muitas vezes explicá-la o quanto a amava. Ela não compreendia. Achava que ele era mais um paquerador. Uma pessoa a mais. Infelizmente a maior parte dos homens comporta-se de modo muito vulgar diante das mulheres. Mas ele era um poeta. Um homem extremamente romântico. Aquele tipo que ao tocar no físico quer sentir a textura da estética que exala dele. Um homem que sonha com uma mulher vestida de cigana e que seria capaz de vesti-la assim para recuperar suas memórias de infância. Um homem que adorava ver a meia taça dos seios contornada de biquinhos de rendas sobressaindo no decote do vestido. Enquanto a maior parte dos homens consegue enganar muito bem as mulheres, pois não sabem que elas são o suprassumo de toda a natureza. Eles querem na realidade é adentrar-se violentamente nelas como alazões em fúria. Ainda comentam entre si, aquelas estórias horríveis que deram uma surra de p.(vocês sabem o que signfica isto), nelas. Que entraram rasgando e arrochando e botando para capar. Mas as mulheres não são receptáculos de furiosos e de insanos. Devido a esta demência masculina, as mulheres não acreditam nos homens. Mas sabe lá uma mulher o que é um poeta? Elas que são tão sensíveis, que são tão polidas como uma rosa ao tempo, que são tão singelas como painas ao vento, deveriam estudar a poesia para captar a essência da alma dos poetas. Um poeta quando está com uma mulher é como um maestro quando dirige uma orquestra. Ele tem a sensibilidade plena de captar o som divino em cada parte, em cada instrumento. Ele sabe perfeitamente onde se encontram os acordes dos violinos. A cadência que vem dos violoncelos. A sinfonia dos teclados harmonizando com o tanger dos violões. A doçura das flautas entrando em sintonia com o grupo. Um poeta não faz sexo. Um poeta rege uma sinfonia de amores e de prazeres. Por isto ele nasceu com o dom de transformar em palavras aquilo que todo mundo não vê quando olha superficialmente todas as coisas. Mas esta mulher machucou demais a alma de seda deste poeta. Ela acusou-o de ser um paquerador comum. Ela não entendeu o estender do seu olhar. Então o poeta vendeu tudo o que tinha e sumiu. Desapareceu sem deixar pista alguma. Os anos passaram e esta dona continuou sua caminhada e iludida pelas artimanhas dos seus sonhos. Um dia ela lembrou-se daquele velho amor do seu poeta. Pensou em visitar outra vez aquele mosteiro onde iniciou de forma mais íntima o relacionamento dos dois. Estava marcada uma palestra para aquela tarde de sábado. Então ela se aprontou e foi. O salão estava repleto. O monge entrou, entoou um mantra e pediu que todos silenciosamente olhassem para dentro de si mesmo e ouvissem os seus corações. Em seguida ele iniciou a palestra. O tema girou na ideia que tudo está em nós mesmos. Somente conhecendo quem somos poderemos conhecer o universo. Tudo de acordo com a antiga sabedoria “conhece-te a ti mesmo” do Portal de Delfos que modificou completamente a vida de Sócrates. A essência da sabedoria universal é uma só. No final ela resolveu aproximar-se do monge para conhecê-lo melhor. Ela havia sentado no fundo do salão e mal dava para ver a sua cabeça raspada e seu hábito marrom. Um senhor de idade bem avançada, mas apresentando uma grande jovialidade. Quando chegou bem pertinho, ela quase desmaiou. Era o poeta que tanto a amara e que ela não compreendeu o seu amor. Ele com toda a doçura explicou-lhe que conhecera nela o verdadeiro amor que um homem pode ter por uma mulher. Como ela não conseguiu compreender o sentimento dele, inclusive desacreditando em seus sentimentos, ele resolveu abandonar tudo e seguir uma vida monástica. Mas ele lhe disse: “Na minha cela tem um enorme S que é a primeira letra de seu nome. Quando o Superior me perguntou que significava aquela letra para mim. Eu disse para ele que era a inicial de Santidade. Por que não?"

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