terça-feira, 30 de abril de 2013

O MUNDO ALÉM DO CÃO

São fatos simultâneos a cada dia, coincidentes como a seta no centro do alvo. O primeiro cabe ao olhar de um poeta solitário. Visão caleidoscópica não perdendo a fração última do segundo de um cair de tarde. O segundo, uma senhora e sua antiga companheira uma cadela vivendo as dificuldades de sua velhice. Vagarosa, tímida, arqueada sob o peso inevitável da abóboda do tempo, com uma idade correspondente a uma pessoa de noventa anos, ela permanece no silêncio de seu passeio, sua amizade à sua dona. Dona? Poderíamos chamar assim àquela senhora? Não caberia melhor outro termo como amiga inseparável? Aquele primeiro citando “sua antiga companheira”. Há na interface desta caminhada uma mensagem silenciosa. Dizem as escrituras sagradas que o pior surdo é o que não quer ouvir. O pior cego é o que não quer ver. O pior coxo é aquele que não quer andar. Pois o caminho do raciocínio vem por esta senda religiosa. Um exemplo com um perfume subliminar, onde somente os verdadeiros degustadores e reconhecedores do sentido mais nobre da vida, conseguem apreender. Não cabe sabedoria em muita dissertação desta cena diária. Os mágicos do amor, aqueles que carregam no bolso do paletó, diamantes de exemplos para abrir diante do palco do espetáculo da existência, conhecem profundamente este questionamento. Como ficam as pessoas que abandonam seus filhos? Ou aquelas que menosprezam seus entes mais queridos? Em que patamar de sentimento se posicionam os seres chamados de humanos, mas que se esquecem dos seus amigos mais íntimos? Quantos filhos abandonam seus pais! Aquela senhora com sua cadela antiga está dando uma lição acima de todos os discursos ou de todas as alegorias sobre a solidariedade. Enquanto ela vai caminhando como uma cuidadora angelical, seus passos, seus gestos, sua atenção redobrada e dedicação por uma cadela, vão atravessando os portais do mundo, impregnando-o pela extensão de um arco-íris de esperança.

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